Concerto duplo para violino e piano em ré menor

Felix MENDELSSOHN

(1823)

Instrumentação: cordas

O Concerto Duplo para violino e piano, escrito por Mendelssohn aos 14 anos, é prova incontestável do desenvolvimento musical que ele atingira precocemente. A riqueza cultural e financeira de sua proeminente família judeu-luterana é algo relevante – sua residência era um dos centros musicais de Berlim, mas esse fato não basta para elucidar o progresso fenomenal que nele fora revelado. Em poucos anos, seu mestre na composição, Carl Zelter, nada mais tinha para ensinar-lhe: “proclamo-o independente, em nome de Mozart, de Haydn e do velho pai Bach.” Schumann anunciara Mendelssohn como “o Mozart do século dezenove” e, com sensibilidade, notara sua maturidade artística surgir “como uma flor desabrochada”. Mendelssohn começara a compor aos nove anos e, aos doze, já afirmava seu estilo ao iniciar o conjunto de Doze Sinfonias para cordas. Aos treze, escrevera o primeiro Concerto para violino, dedicado ao professor Eduard Ritz, e, no ano seguinte, o magnífico Concerto Duplo, estreado por Ritz, ao violino, e Mendelssohn, ao piano, numa apresentação privada. Ambos os concertos, escritos na austera tonalidade de ré menor, não possuem número de opus e não foram publicados até a segunda metade do século XX. Redescobertos recentemente, eles vêm, merecidamente, estabelecendo seu lugar nos programas das salas de concerto.

Mendelssohn foi um bom violinista e, ainda que preferisse tocar viola a tocar violino, obteve grande sucesso com obras para este instrumento, principalmente com o seu último concerto, que figura entre os três mais populares do gênero. Porém, foi como executante de órgão e piano – seu instrumento favorito – que ele alcançou notoriedade. A ideia de unir instrumentos tão diversos – violino e piano – como solistas em um concerto com orquestra fora inovadora, visto que, provavelmente, eram desconhecidas as raras incursões no gênero realizadas por Haydn e Mozart.

O equilíbrio e a clareza conseguidos pelo compositor adolescente são insuperáveis. A obra possui passagens virtuosísticas para os dois instrumentos e é engenhosamente estruturada, permitindo a cada um brilhar à sua própria maneira. Além do emprego da técnica de escrita fugata, herança da devoção pela música de Bach, Mendelssohn utiliza também recursos incomuns, como um apaixonado recitativo de violino acompanhado de tremolos no piano, sem orquestra, na seção central do primeiro movimento. Por todo o concerto, os solistas dialogam por meio de imitação e contracanto, brincam com pequenos ornamentos e correm de mãos dadas pelas escalas e arpejos.

A similitude entre Mendelssohn e Mozart – no talento prodigioso e na obra variada e extensa – foi acompanhada pelo destino da curta existência: Mozart faleceu aos 35 anos e Mendelssohn, aos 38. O virtuosismo de Paganini, a estrutura de Beethoven e o espírito de Bach convivem no universo de Mendelssohn, intimamente iluminado pela inocência, alegria e simplicidade, onde lucidez e adequação vestem melodias apaixonadas do início ao fim. É Felix – feliz, em latim, que, nascido há mais de duzentos anos, ainda revela em sons sua paixão pela vida.

Marcelo Corrêa, Mestre em Piano pela UFMG, professor da Escola de Música da UEMG

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