Concerto para trompete

Henri Tomasi

(1948)

Instrumentação: Piccolo, 3 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, 2 fagotes, 4 trompas, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, harpa, celesta, cordas.

 

Henri Tomasi é um compositor pouco conhecido fora da França. Pertence à linhagem musical de Maurice Ravel, apesar do sobrenome nobiliárquico italiano advindo de seus antepassados que viveram nas ilhas mediterrâneas. Enquanto Ravel representa o litoral oeste da França, o povo basco e suas raízes espanholas, Tomasi é filho da costa sul, Marselha, de influências culturais italianas. Na celebração do centenário de nascimento de Tomasi – trinta anos após sua morte – suas cinzas foram levadas para Penta-di-Casinca, uma aldeia francesa da Córsega, terra-natal de sua família.

 

Tomasi iniciou os estudos musicais no Conservatório de Marselha e prosseguiu-os no Conservatório de Paris, obtendo sólida formação com renomados compositores, entre eles Paul Vidal, Vincent d’Indy, Philippe Gaubert e Paul Dukas. Este último transmitiu-lhe as delicadezas da orquestração e da escrita idiomática para cada instrumento. A orquestração de Tomasi é brilhante, dotada de colorações inovadoras, e sua produção composicional compreende um elevado número de obras concertantes: 16 concertos privilegiam cada qual um instrumento, não só os mais contemplados pelo gênero, mas também o oboé, a viola, o saxofone, a harpa e o fagote. O mais executado é o Concerto para trompete e orquestra, dedicado ao trompetista Ludovic Vaillant, solista da Orquestra Nacional de Paris. Vaillant estreou a obra em 1949 com a Orquestra da Rádio Televisão Francesa, sob a regência do próprio compositor.

 

O Concerto para trompete se inicia com um golpe de caixa-clara seguido de uma fanfarra, ou clarinada, que expõe o timbre do instrumento solista de forma característica e familiar aos ouvidos. Mas não nos enganemos com aspectos externos dessa introdução militaresca: nesses três compassos o compositor expõe o material temático no qual se baseará quase todo o concerto. A fanfarra inicial é intercalada por um episódio lento: o solista utiliza a surdina, e então somos brevemente transportados ao sentimentalismo das antigas orquestras americanas de jazz. O dualismo segue até uma elaborada cadenza que caracteriza o movimento, devido à sua extensão. O segundo movimento é declaradamente um noturno: assemelha-se à escrita do gênero para piano, imortalizado por Chopin, de peças serenas e meditativas que sugerem ou evocam a noite. A lírica melodia do trompete com surdina, conduzido pela harpa, amplia a atmosfera noire do movimento. A obra conclui-se com um curto e espirituoso allegro, no qual são reaproveitados diversos elementos do primeiro movimento.

 

A inventividade de Henri Tomasi é excepcional. É fato que ele se tenha interessado pela composição enquanto improvisava ao piano em bares, cabarés, teatros e principalmente no cinema-mudo, em que trabalhou durante a juventude a fim de custear os estudos musicais. A despeito de sua boa formação, Tomasi foi um artista sem escola: “meu conhecimento musical não se baseia em nenhum sistema”, afirmava. Sua independência, tanto ideológica quanto estética, manteve sua música distante dos movimentos vanguardistas. Assim resumiu Christian Tournel: “Tomasi jamais escreveu uma nota pelo prazer intelectual da descoberta, mas sim para promover uma combinação íntima que suscita determinada emoção em sua alma poética”.

 

Marcelo Corrêa
Pianista, Mestre em Piano pela Universidade Federal de Minas Gerais, professor na Universidade do Estado de Minas Gerais.

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