O Príncipe de Madeira, op. 13: Suíte

Bela BARTÓK

(1914/1917, revisada em 1932)

Instrumentação: 2 piccolos, 4 flautas, 4 oboés, 2 cornes ingleses, requinta, 4 clarinetes, clarone, 4 fagotes, 2 contrafagotes, 4 trompas, 6 trompetes, 3 trombones, tuba, 2 saxofones, tímpanos, percussão, 2 harpas, celesta, cordas.

 

Bartók compôs o balé O Príncipe de Madeira logo depois da ópera O Castelo do Barba Azul, entre 1914 e 1916, período em que, na Hungria, a população ressentia-se do confinamento imposto pela Primeira Guerra. Nas duas obras ele contou com a parceria do poeta Béla Balazs, que as concebeu como soturnas fábulas simbolistas. No caso da ópera, os autores tiveram o suporte da lenda bastante conhecida do Barba Azul; porém, o libreto e a música do balé foram considerados muito sombrios para uma simples fantasia coreográfica. Mais tarde, Bartók extraiu do bailado uma suíte de orquestra. A instrumentação exuberante privilegia os instrumentos de percussão (sobretudo o papel solista do xilofone) e traz a curiosidade tímbrica de uma celesta a quatro mãos.

 

O Prelúdio constrói um crescendo a partir do quase inaudível pianissimo nos contrabaixos e tímpanos e, como um amanhecer, descortina o cenário – dois castelos, separados por densa floresta e um regato. No primeiro castelo, aos cuidados de uma Fada, vive a Princesa. Do outro, o Príncipe observa-a a dançar no bosque.

 

A dança da princesa apresenta um tema irônico do clarinete, ao qual se contrapõem as flautas, sobre os dedilhados das cordas. O Príncipe apaixonado tenta aproximar-se. Mas, por ordem da Fada, as árvores se opõem à sua passagem. Sustentada pelos tímpanos, A dança da floresta, de caráter impressionista, cria grande agitação e conduz a um violento tutti. As árvores só se acalmam com as notas encantadas da harpa.

 

Para chamar a atenção da Princesa, o Príncipe cria um sósia de madeira ornamentando seu cajado com a coroa, o manto e seus próprios cabelos. Canto de trabalho do príncipe. A Fada dá vida a esse manequim, cujo tema é caracterizado nos pizzicatos das cordas col legno e pelo importante desempenho do xilofone. O boneco entalhado logo conquista o coração da curiosa Princesa.

 

O regato mantém o Príncipe afastado, ameaçando-o com a dança das águas. Anunciadas nas madeiras e nas cascatas da harpa e da celesta, as ondas em tumulto formam violento agitato da orquestra. Despojado e desprezado, o rapaz se desespera.

 

Diante de tamanha tristeza, finalmente, a Fada se comove. Ela, então, ordena que toda a Natureza devolva ao Príncipe a antiga beleza, coroando-o de flores como Rei do Bosque.

 

Por outro lado, o mecanismo do manequim se altera e seus movimentos tornam-se grotescos. A Dança da princesa e do príncipe de madeira possui novidades tímbricas, rusticidade e bastante complexidade rítmica. Ao final, a Princesa o rejeita.

 

Cheia de admiração, ela percebe o esplendor do verdadeiro Príncipe. Mas, para encontrá-lo, deverá suplantar os mesmos obstáculos que ele antes havia enfrentado – a floresta, as águas turbulentas, até o sacrifício da própria beleza. Só assim ela se tornará digna de seu amor. Cheio de compaixão, o Príncipe enfim abraça a Princesa.

 

No Epílogo, a Natureza retoma seu aspecto aprazível em notas sustentadas por madeiras e cordas. Sobre os arpejos da harpa, a orquestra se cala em clima de paz e felicidade, de volta à tonalidade original.

 

Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado. Apresenta o programa semanal Recitais Brasileiros, pela Rádio Inconfidência.

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