Sinfonia nº 100 em Sol maior, “Militar”

Franz Joseph HAYDN

(1794)

Instrumentação: 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 2 trompas, 2 trompetes, tímpanos, percussão e cordas.

 

Desde a redescoberta de J. S. Bach, em meados do século XIX, o espírito romântico parece ter eclipsado tudo o que havia entre o Kantor de Leipzig e Beethoven, com exceção de Mozart. Tal mentalidade musical teve reflexos até tempos bem recentes e só há relativamente pouco tempo nomes importantes, histórica e esteticamente, voltaram à luz de seu real merecimento: os filhos de Bach, Boccherini, Cimarosa, Galuppi, dentre outros.

 

Talvez por não ter sido nem revolucionário nem reacionário, ou por não ter nenhum tipo de ambição quanto à posição social do músico, (via de regra, então, empregado da aristocracia ou da Igreja), ou mesmo por não ter sido um “inventor” ou um questionador de estilos, gêneros e formas, o nome de Joseph Haydn tenha caído injustamente num ostracismo reverente, mantendo-se vivo quase apenas como nome essencial para o repertório didático.

 

Haydn foi sobretudo um grande organizador, e com isso, de maneira metódica, sólida e tenaz (como em sua vida pessoal), tornou-se alma e símbolo do período Clássico. Não se deve a ele a criação da forma sonata, ou da sinfonia, do quarteto de cordas ou da sonata para piano, mas coube-lhe o papel de sistematizá-los e de cristalizar-lhes a estrutura e as feições fundamentais.

 

No entanto, isso em hipótese alguma significou, em Haydn, falta de originalidade: sua obra revela capacidade criativa copiosa, dentro dos limites que ela mesma se impõe. Um de seus pontos mais originais está justamente nessa capacidade de consolidar uma linguagem que já se esforçava por afirmar-se, bem como de tornar fecundos os meios e gêneros que constituiriam os seus (dessa linguagem) veículos de expressão. Assim, Haydn estuda cuidadosamente as suas fontes (dentre elas, a mais fundamental seja talvez C. Ph. E. Bach) e as consolida, criando sua própria linguagem e dando voz e espírito à música do período Clássico.

 

A produção sinfônica de Haydn é pródiga e acompanha-o por toda a vida. Foram cerca de cento e seis sinfonias, a primeira datando de 1757 e a última, de 1795. Costuma-se localizá-las em três grandes grupos: no primeiro, as sinfonias 1 a 81; no segundo, as sinfonias 82 a 92, chamadas Sinfonias Parisienses; no último, as de número 93 a 104, chamadas Sinfonias Londrinas. Outras duas obras, compostas entre 1757 e 1760, incluem-se como obras à parte.

 

As Sinfonias Londrinas, compostas entre 1791 e 1795, marcam um período de maturidade e de decantação do estilo haydniano. Constituem dois grupos: o primeiro, de números 93 a 98, composto durante a primeira visita de Haydn à Inglaterra, quando recebeu o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Oxford; as sinfonias do segundo grupo, 99 a 104, foram compostas em Viena e Londres, para a sua segunda viagem à Inglaterra.

 

Pertence a este grupo, portanto, a Sinfonia nº 100. Escrita entre 1793 e 1794, seu apelido (“militar”) deriva do uso, no segundo movimento, de evocações de fanfarras com trompetes e efeitos da percussão. Estes também retornam ao final do último movimento, colorindo a orquestração dos tutti. Com o bom humor que o acompanhou por toda a vida e que transparece também em sua obra, Haydn sabe, na Sinfonia nº 100, transcender à regra sem transgredi-la, confirmando sua aderência completa à linguagem do Classicismo.

 

Moacyr Laterza Filho
Pianista e cravista, Doutor em Literaturas de Língua Portuguesa, professor da Universidade do Estado de Minas Gerais e da Fundação de Educação Artística.

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