Sinfonietta para orquestra

Francis POULENC

(1947)

Instrumentação: 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 2 trompas, 2 trompetes, tímpanos, harpa, cordas

Na reestruturação sofrida pela British Broadcasting Corporation após a Segunda Guerra Mundial, foi ao ar em Londres, em 1946, um novo canal da Rádio BBC – que ficou conhecido como Terceiro Programa, atendendo à demanda de um novo público e destinado à divulgação de manifestações artísticas mais densas do que até então. O novo canal recebeu o apoio imediato de artistas e intelectuais e se impôs como uma das principais forças culturais da Inglaterra. Com o intuito de promover compositores jovens ou pouco conhecidos, o canal se empenhou em encomendar e estrear inúmeras obras musicais. Em 1947, ao encomendar e executar a Sinfonietta de Francis Poulenc, representante da avant-garde francesa, o canal britânico, que completara um ano, pôs de lado antigas e novas querelas entre a Inglaterra e a França. A arte musical, vitoriosa, provou situar-se numa esfera acima dos entraves políticos desses dois países que, apesar da recente aliança contra o nazismo, conservavam o espírito de rivalidade.

Francis Poulenc foi um reconhecido compositor orquestral de balés e concertos, mas não se dedicou à sinfonia, consistindo a Sinfonietta em sua única incursão no gênero sinfônico. Contudo, a obra assombra pelo domínio da escrita para grande conjunto instrumental, intuitivamente realizada por um orquestrador autodidata que possuía todos os predicados para se tornar um grande sinfonista. O título, que significa pequena sinfonia, remete ao objetivo do compositor de criar uma obra menor. Mas as ideias, por fim, se expandiram em quatro episódios sinfônicos bem-humorados e salpicados de pastiches estilísticos de compositores famosos, notadamente os austríacos Haydn e Mozart e os russos Tchaikovsky e Stravinsky. É evidente aí o estilo do próprio Poulenc, que, costumeiramente, reproduz, em diferentes obras, os mesmos encadeamentos harmônicos – geralmente perceptíveis em trechos líricos e apaixonados – como os que surgem no centro do primeiro movimento da Sinfonietta e envolvem, aos poucos, o revolto tema inicial. O segundo movimento, dançante e declaradamente tchaikovskiano, é um típico scherzo – brincadeira, em italiano –, tanto por sua forma tripartida, devida a Beethoven, quanto pelo conteúdo jocoso de seu tema. O movimento relembra o final do balé Les Biches, criado por Poulenc em 1923 para a companhia russa de Sergei Diaghilev. Já o terceiro movimento explica, com a sua doçura, o sucesso de uma obra agradável em todos os sentidos. Poulenc, em 1947, escrevera ao amigo Darius Milhaud: “tive uma boa primavera este ano e agora estou prestes a compor uma Sinfonietta para a BBC”; e, em nova correspondência, completara: “a Sinfonietta foi muito bem em Londres”. No movimento final, o autor reforça a estética neoclássica posta em voga por Stravinsky e o humor vibrante resgatado dos divertimenti de Mozart.

A Sinfonietta é claramente uma obra universal, na qual Poulenc mescla a pluralidade de influências à sua peculiar elegância e obtém uma celebração musical repleta de jeu d’esprit, de leveza e da joie de vivre típica de um genuíno artista parisiense.

Marcelo Corrêa
Pianista, Mestre em Piano pela Universidade Federal de Minas Gerais e professor na Universidade do Estado de Minas Gerais.

Olho:
A Sinfonietta é uma obra universal, na qual Poulenc mescla a pluralidade de influências à sua peculiar elegância e obtém uma celebração musical repleta de jeu d’esprit, de leveza e da joie de vivre típica de um genuíno artista parisiense.

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