Concerto para violoncelo em Ré maior, Hob. VII b:2

Franz Joseph HAYDN

(1783)

Instrumentação: 2 oboés, fagote, 2 trompas, cordas.

 

Por quarenta anos, Haydn trabalhou para a poderosa família Esterházy, combinando as funções de regente e compositor. O ritmo de trabalho era alucinante, envolvendo música de câmara, concertos sinfônicos, óperas, música religiosa e para o teatro. Felizmente, Haydn dispunha de excelente orquestra, disponível para testar e ensaiar suas obras, privilégio que ele soube aproveitar com sabedoria. Optando pelo experimentalismo, Haydn desenvolveu uma linguagem musical própria, detalhista, intelectual e espirituosa. Sua obra foi decisiva para a fixação e a plena maturidade dos vários gêneros ligados à forma sonata clássica (sobretudo a sinfonia e o quarteto de cordas).

 

Entre as músicas sinfônicas exigidas de um compositor de corte, os concertos para instrumentos solistas possuiam características fundamentalmente diferenciais. Compostos para ocasiões e solistas específicos, consideravam os recursos individuais do instrumentista e o gosto particular de quem fizera a encomenda. Na corte de Esterházy havia brilhantes solistas e, para eles, o compositor escreveu muitos concertos, cuja maioria se perdeu. Algumas dessas partituras, pelo caráter utilitário e imediatista de sua gênese, permaneceram apenas esboçadas; outras foram destruídas no incêndio da Casa de Ópera de Esterháza (1779) e muitas se extraviaram.

 

De 1778 a 1790, o principal violoncelista da orquestra Esterházy foi Anton Kraft, para quem Haydn compôs o célebre Concerto em Ré maior. Durante muito tempo duvidou-se da autenticidade dessa peça que, até uma data relativamente recente, julgava-se escrita pelo próprio Anton Kraft (ele, efetivamente, deixou alguns concertos para seu instrumento). Sintomaticamente, o criador dessa polêmica foi Nikolaus Kraft, filho de Anton e também violoncelista. O descobrimento da partitura autógrafa de Haydn, em 1953, dissipou finalmente as dúvidas e restituiu a obra ao verdadeiro autor; como, aliás, suas características e a excelência musicais indicavam. Trata-se de um concerto da plena maturidade do compositor, notável por explorar sabiamente as possibilidades técnicas do instrumento (por exemplo, seus efeitos de cordas duplas e triplas) e pela beleza melódica.

 

No primeiro movimento, Allegro moderato, os dois temas principais são apresentados em longa introdução orquestral. A bela melodia do primeiro tema predominará ao longo de todo o andamento que, unificado por esse motivo inicial, apresenta uma infinidade de episódios contrastantes. Terminada a introdução, o solista reexpõe os temas e os desenvolve. A extensa parte central permite-lhe rasgos virtuosísticos e, na conclusão, ele alcança as notas mais agudas do instrumento.

 

O Adagio em Lá maior, com a orquestração reduzida, constrói-se como um solo para violoncelo. No motivo rítmico inicial (de três notas) ecoa a conclusão do tema principal do primeiro movimento. Desenvolve-se calmamente, numa atmosfera admiravelmente lírica.

 

O Finale é um Allegro – o violoncelo introduz o tema que serve de refrão para os diferentes episódios, criando um rondó com forte sabor popular e de grande vivacidade melódica.

 

Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado. Apresenta o programa semanal Recitais Brasileiros, pela Rádio Inconfidência.

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