Hamlet e Ofélia

William Walton

(1947)

Instrumentação: 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 4 trompas, 2 trompetes, 3 trombones, tímpanos, percussão, harpa , celesta, cordas.

 

Embora eclipsada pela monumentalidade da tradição de Ralph Vaughan Williams e pelo modernismo de Benjamin Britten, a obra de William Walton representa uma das maiores realizações da música inglesa do século XX. Filho de cantores, Walton iniciou sua vida musical como corista de igreja, antes de ingressar, aos dezesseis anos, no coro da Christ Church, Universidade de Oxford. Na biblioteca da universidade descobriu as obras de Debussy, Ravel, Prokofiev e Stravinsky – cruciais para o desenvolvimento de sua linguagem musical. A experiência em Oxford o aproximou da elite inglesa, de onde obteve apoio financeiro para seus projetos. Com o Concerto para viola e orquestra (1928) e a cantata Belshhazzar’s Feast (1931) consolidou-se como um dos mais talentosos artistas de sua geração. O Concerto, em especial, tornou-se um divisor de águas. Caracterizada pela exploração de um contraponto mais denso e expressivo, a obra o diferencia de seus contemporâneos Constant Lambert, Peter Warlock, Lord Berners e Arthur Bliss. Embora essas obras lhe tivessem garantido reconhecimento público, sua independência financeira viria apenas com a composição de música para filmes, a partir de meados da década de 1930.

 

Entre as décadas de 1930 e 1960, a composição de trilhas para filmes representava a mais lucrativa opção profissional para os compositores ingleses. Assim, Vaughan William, Britten, Bliss, Arnold Bax, Malcolm Arnold e Walton figurariam amiúde nos créditos dos filmes produzidos pelo efervescente mercado cinematográfico da época. Entre 1934 e 1969, Walton compôs trilha para quatorze filmes, geralmente agrupados em três categorias: filmes em que estrelava Elisabeth Bergner; filmes de propaganda do período da Segunda Guerra; e filmes dirigidos ou produzidos por Laurence Olivier. Da parceria com Olivier destaca-se a trilogia Shakespeare, que inclui Henry V (1944), Hamlet (1947) e Richard III (1955). Segundo Walton, três são os elementos que orientam a composição de uma trilha para uma obra de Shakespeare: o humor, a atmosfera e a noção estilística de período. O humor é dado pelos efeitos incidentais, a atmosfera é sugerida pelas grandes sequências e cenas e a noção de período trata-se das alusões à música elisabetana.

 

Baseado na obra homônima de Shakespeare, Hamlet começou a ser filmado em maio de 1947 e foi estreado em 6 de maio de 1948 no cinema Odeon, Leicester Square, Londres. Composta e gravada entre novembro e dezembro de 1947, a trilha foi concebida como um conjunto de peças adaptáveis às salas de concerto. Da música para o filme surge, entre 1967 e 1968, o arranjo de Muir Mathieson, Hamlet e Ofélia: um poema para orquestra. Regente responsável pela produção musical do filme, Mathieson orientou-se pelos leitmotivs criados por Walton para as personagens do filme ao contrapor o tema de Hamlet, nas cordas, e o tema de Ofélia, nos sopros. Enquanto o tema de Hamlet é tortuoso, cromático e caracterizado por inesperadas suspensões, sugerindo o drama psicológico do personagem, o tema de Ofélia é predominantemente modal e sugestivamente folclórico e evoca a ligação do personagem com a natureza.

 

Igor Reyner
Pianista, Mestre em Música pela UFMG, Doutor em Literatura no King’s College London e colaborador do ARIAS/Sorbonne Nouvelle Paris 3.

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