Bedrich Smetana
Instrumentação: Piccolo, 2 flautas, 2 oboés, 2 clarinetes, 2 fagotes, 4 trompas, 2 trompetes, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, harpa, cordas.
Costuma-se considerar as ditas Escolas Nacionais, que surgem a partir da segunda metade do século XIX, como espécies de derivações do Romantismo. Seria mais genuíno, porém, observá-las como suas herdeiras. O fato é que, se Liszt e Wagner levaram o Romantismo a um ponto tão extremo que só a descoberta de novos caminhos seria a alternativa possível, isso abre a porta para um movimento de renovação nacional que se estende à maior parte dos países europeus (e, um pouco mais tarde, para além deles). Nesse ponto, a História da música se alinha à História política, e a tomada de consciência de identidades nacionais e de sentimentos patrióticos faz da música europeia menos cosmopolita e mais multinacional. A hegemonia impositiva das músicas alemã e italiana gera uma reação que buscará na singularidade sua válvula de escape. As Escolas Nacionais encontram essa singularidade na emancipação de modalismos regionais e na assimilação de características específicas das suas respectivas tradições musicais: ritmos, escalas, melodias tradicionais e certos gêneros ou estilos instrumentais. Fundamentadas em um folclore vivo, essas escolas seguem caminhos próprios e independentes e, devidamente consolidadas, não sucumbirão à pressão que virá, mais tarde, do Expressionismo alemão, de um lado, ou da música revolucionária de Debussy e Ravel, de outro. É nesse contexto que surge a figura de Bedrich Smetana.
Smetana deixou um legado tão significativo que fez da escola tcheca continuamente fecunda, ao contrário de outras correntes nacionais (como a húngara), que sofreram um eclipse, até se renovarem pelos ares do século XX. Suas oito óperas foram definitivas para consolidar a linguagem que seus compatriotas iriam lapidar e desenvolver. De sua música sinfônica, sua obra-prima é sem dúvida o ciclo de seis poemas sinfônicos intitulado MaVlast (Minha Pátria), dentre os quais destaca-se o segundo: Vltava, mais conhecido pelo seu nome em alemão: Die Moldau (O Moldávia).
MaVlast foi composto entre 1874 e 1879, quando a saúde mental do compositor se encontrava em declínio. Embora seja um ciclo de seis obras, cada uma delas foi concebida como uma peça autônoma. O Moldávia foi composto em 1874 e estreado no ano seguinte, sob a batuta de Adolf Cech.
É sabido que o poema sinfônico, como em Liszt e, mais tarde, Richard Strauss, baseia-se em um argumento literário. O Moldávia foge à regra. O próprio rio é o mote do compositor, que o pinta desde suas nascentes, passando por suas corredeiras até o seu desaguar no rio Elba.
O tema principal da obra, baseado em uma antiga canção folclórica tcheca (reelaborada pelo compositor), tem uma grande similaridade com a melodia do hino nacional de Israel. Há quem diga que um tenha servido de base para o outro. O fato, porém, é que os modalismos das tradições musicais de ambos os povos possuem elementos comuns. O Moldávia é, sem dúvida, uma das obras mais conhecidas e executadas de Smetana. Com razão! Ele é uma bela amostra das origens dessa Escola Nacional que ainda hoje mantém frescor e fecundidade.
Moacyr Laterza Filho
Pianista e cravista, Doutor em Literaturas de Língua Portuguesa, professor da Universidade do Estado de Minas Gerais e da Fundação de Educação Artística.