Sinfonia nº 7 em dó sustenido menor, op. 131

Sergei PROKOFIEV

(1951/1952)

Instrumentação: Piccolo, 2 flautas, 2 oboés, corne inglês, 2 clarinetes, clarone, 2 fagotes, 4 trompas, 3 trompetes, 3 trombones, tuba, tímpanos, percussão, harpa, piano, cordas.

 

As sete sinfonias de Prokofiev permitem uma visão bastante abrangente de sua evolução pessoal e de suas preocupações estéticas, diretamente relacionadas com a história de seu país. Sob essa perspectiva, a carreira do compositor divide-se em três períodos bem distintos – a fase russa, a ocidental e a soviética.

 

A fase russa compreende os anos de aprendizado e afirmação no cenário musical da Rússia czarista. Sua mãe era excelente pianista amadora e Prokofiev, aos seis anos, já usava o instrumento para compor pequenos esboços musicais, como um curioso Galope hindu (escrito no modo lídio de fá, para evitar as teclas pretas). Aos treze, ingressou no Conservatório de São Petersburgo, tornando-se o aluno mais rebelde dessa conceituada instituição, então sob a direção de Rimsky-Korsakov. Paralelamente, o jovem compositor participa das Noites de Música Contemporânea, entrando em contato com as obras inovadoras de Debussy e Schoenberg. Intuitivamente, a música de Prokofiev se associa à estética futurista da época, à pintura de Kandinsky e à literatura de Maiakovsky. Algumas de suas recentes composições (entre elas, a violenta Suite Cita, de 1915) causavam espanto pela aspereza harmônica e rítmica. Alguns críticos o acusavam de maquinismo futurista e de iconoclastia revolucionária. A Primeira Sinfonia foi a resposta do compositor – concebida segundo os processos formais de Haydn, tornou-se amplamente conhecida como Sinfonia clássica.

 

Em 1918 o compositor inicia seu período “ocidental”, quando abandona a Rússia para viver por muitos anos entre a França, os Estados Unidos e a Alemanha. Aos poucos, impõe-se nos principais centros culturais. Entretanto (diferentemente de Debussy, Stravinsky ou Schoenberg), Prokofiev nunca pretendeu renovar a linguagem musical ou criar uma nova “técnica” de composição. Suas inovações se referem mais ao “efeito” do que às estruturas musicais. Nesse aspecto, a destreza de exímio pianista lhe foi muito útil e, mesmo quando acusado pela vanguarda radical de retrógrado e conservador, suas obras foram frequentemente provocativas e “modernas”. As três sinfonias “ocidentais” são muito diferentes entre si. A Segunda Sinfonia tem caráter ruidoso, áspero e provocativo. Prokofiev visa à crítica vanguardista francesa e compõe uma obra “moderna, de ferro e aço”. O dramatismo da Terceira Sinfonia deve muito ao contexto de sua ópera O anjo de fogo, à qual está ligada em sua gênese. É um dos trabalhos mais ousados e experimentais do compositor. A Quarta Sinfonia também se associa a uma obra cênica, no caso, o balé O filho pródigo. Mas seu caráter despojado é diametralmente oposto ao da sinfonia anterior.

 

A partir de 1927, Prokofiev começa a reatar contatos com a URSS. Em 1936, com objetivos pedagógicos, escreveu para o Teatro Infantil de Moscou o conto musical Pedro e o Lobo, uma das composições mais populares do século XX. Nesse ano voltou definitivamente à Rússia, iniciando sua fase “soviética”, durante os mais rigorosos anos dos expurgos stalinistas. A produção desse último período, muitas vezes desigual, inclui obras-primas instrumentais como o balé Romeu e Julieta, as trilhas para os filmes de Sergei Eisenstein e as últimas sonatas para piano. Na Quinta Sinfonia, o compositor busca tornar-se mais compreensível ao grande público e, mesmo mantendo altíssimo nível compositivo, seu estilo mostra-se polido pelo predomínio de ocorrências melódicas e pela estrutura formal clássica. O objetivo foi alcançado – a Quinta figura entre as melhores obras de Prokofiev, além de ser a mais frequentemente interpretada. As duas sinfonias seguintes procuram manter-se no mesmo caminho. A Sexta Sinfonia possui uma mordacidade implícita – o compositor parece zombar dos próprios recursos usados. Um ano depois de sua estreia, em 1948, no auge da campanha antiformalista, Prokofiev foi punido e obrigado a se colocar publicamente à disposição do regime.

 

A Sétima Sinfonia, composta poucos meses antes da morte do compositor, nasceu de uma encomenda da Seção de Música para a Juventude da Rádio de Moscou. Prokofiev utilizou uma linguagem simples, destituída de conflitos, de energia positiva e controlada. Tendo em mente uma plateia jovem, evita o tom bombástico ou patético e valoriza a limpidez de extensas linhas melódicas (o modelo assumido é Tchaikovsky). O poético primeiro andamento utiliza todos os recursos instrumentais da palheta russa tradicional, valorizando a separação dos timbres. O segundo possui caráter otimista, jovial e despreocupado, mostrando a alegria de viver de um compositor que, entretanto, se encontrava doente, amargurado e cético. O terceiro movimento faz uma apologia da valsa, lembrando o Prokofiev dos bailados. O final, simultaneamente lírico e festivo, oferece sonoridades cintilantes obtidas pelo emprego inusitado das campanas.

 

Prokofiev morreu a 5 de março de 1953, coincidentemente o mesmo dia da morte de Stalin. A Sétima Sinfonia recebeu, postumamente, o Prêmio Lênin, em 1957.

 

Paulo Sérgio Malheiros dos Santos
Pianista, Doutor em Letras, professor na UEMG, autor dos livros Músico, doce músico e O grão perfumado – Mário de Andrade e a arte do inacabado.

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